Na tarde de sábado, 10 de maio de 2014, a cidade de Campinas
sediou a 4ª Marcha da Maconha, um movimento que tem crescido ano a ano e que
desta vez propôs a estatização em vez da simples legalização da erva. O blogue
entrevistou um dos organizadores e participantes do grupos de estudos que a
cidade tem para tratar do assunto. Confira na íntegra a entrevista com Luiz
Fernando Petty.
Reportagem – Qual é o
objetivo de vocês com a realização da Marcha da Maconha?
Luiz Fernando Petty –
O tema da Marcha deste ano é Maconha Legal é Maconha Estatal ou Cultivada no Meu
Quintal. A gente está aqui com objetivo de dialogar com a população por novas
políticas de drogas, diferentes das adotadas frequentemente, seja as politas
carcerárias, seja as políticas seja as políticas de prender os dependentes
químicos em clínicas picareuticas como eu costumo chamar e pensar num projeto
de legalização. A gente tem a experiência do Uruguai, a experiência dos Estados
Unidos. A gente tem essas várias políticas que nos permite pensar em um projeto
que não seja nem o do Uruguai, nem o dos Estados Unidos, mas um projeto
tupiniquim. Um projeto próprio. Um projeto brasileiro, mas que possa se voltar
um pouco para o projeto do Uruguai no sentido da estatização. A estatização é
muito positiva no sentido de ela não ... de que todo o dinheiro obtido venha de
volta para o Estado, que tenhya a preocupação de não fazer propaganda, não ter
fetiche de mercadoria de ser positivo pensando também no caso do uso abusivo da
droga. O capitalismo incentiva muito você a consumir, consumir.
Reportagem – Mas existe
propaganda de álcool...
Petty – Justamente.
No Brasil a gente tem a maior corporação brasileira e entre as dez pessoas mais
ricas, pelo menos duas estão na indústria cervejeira.
Reportagem – Quais são?
Petty – São tanto
a Ambev quanto a Itaipava. Os maiores acionistas estão entre as dez pessoas
mais ricas do País. Além disso, a indústria farmacêutica também tem um ou dois
nesta lista das pessoas mais ricas do País. Eu acho que você fetichiizar essa
mercadoria, incentivar, a gente acaba tendo um problema social como é o do
álcool. A gente tem uma população que faz uso abusivo do álcool e a torto e a
direito e a gente está aí há anos querendo regulamentar o mercado de álcool. A
gente quer pensar em projetos acima de tudo. Talvez a estatização não seja a
melhor. Mas foi o que a gente, em reunião, conseguiu debater e achou que era o
mais coerente Só que não a estatização igual a que o Uruguai faz. O Uruguai,
ele tem alguns problemas que se dá no controle Por exemplo, o usuário, ele tem
uma carteirinha de usuário. Você só pode fumar 480 gramas por ano. Eu acho
muito curioso porque quando a gente observa, eles falam “não, tem que ter
controle, maconha é uma droga”, mas quem controla seu consumo de cerveja? E o
cigarro que você fuma Tem vários fatores que a gente não releva na hora de
olhar para o Uruguai onde tem que controlar. Qual o controle de uma droga que
já, comprovadamente não causa tanta dependência, não é destrutiva para o corpo.
Reportagem – Você acha
que esse debate hoje é visto com mais seriedade ou continua ainda sendo visto
apenas como uma curiosidade distante?
Petty – Eu acho
que existem projetos claros de tentar colocar essa temática nos diversos
países. Não sei se é uma cartilha norte-americana. Mas vejo que Fernando Henrique
Cardoso, Margaret Thatcher , Bill Clinton, são figuras muito simbólicas no
período de guerra às drogas e hoje em dia estão falando para Deus e o mundo
sobre descriminalização, que a maconha não é uma droga tão pesada, que a gente
possa repensar ...
Reportagem – Mas maconha
é droga?
Petty – Justamente.
É uma planta. Mas é uma planta que pode ser considerada uma droga se a gente
pensar no como se conceituou historicamente esses produtos.
Reportagem – Em Campinas,
como você considera que está essa discussão? É ainda uma coisa muito pequena
diante da importância do assunto?
Petty – Sim.
Campinas tem uma população maior que várias capitais do País e junta umas 600
pessoas como a gente está vendo aqui. Não sei se é um número adequando. A gente
entende que para o interior, não existe uma Avenida Paulista que facilite as
pessoas para chegar aqui no Centro, o acesso às vezes ao transporte é muito
difícil. A gente tem vários bairros satélites, como Barão Geraldo, Campo
Grande, Ouro Verde, Sousas, e na favela um real faz a diferença. E são três
reais, né? A passagem de ônibus está mais cara que a maconha.
Reportagem – A não
legalização da droga, de certa forma, ela colabora com deixar muitas vezes a
favela à mercê do tráfico?
Petty – A proibição
auxilia no massacre de pessoas indesejadas. Então você legitima a não presença
desse indivíduo porque ele é traficante, mesmo que você não tenha prova, como
nos casos do Amarildo, da Cláudia, Você legitima o afastamento ou o domínio de
uma visão generalista. E lota as prisões. O Brasil tem a quinta maior população
carcerária do mundo. Será que isso é porque a gente tem mesmo muitos bandidos? Mais de 65% das mulheres estão presas por
tráfico de drogas. Além de tudo, tem a questão de gênero, a questão LGBT, a
questão da autonomia do corpo. A gente também não briga só pela questão das
drogas A gente quer que as nossas companheiras possam chapar tranquilamente sem
serem consideradas putas por isso.
Reportagem – E o uso
de crianças no tráfico?
Petty – Isso é
muito complicado. Você legalizando pode ter controle. Um controle que não
precisa ser abusivo como o do Uruguai, mas tem um controle que é, por exemplo.
São Paulo tem um controle mais rígido com a questão da bebida para menores de
idade. Você, com um produto legal, pode fazer isso. Com um produto ilegal você
vira as costas. Finge que não acontece. O que você acha que é mais fácil hoje,
um moleque conseguir um breja ou ou um baseado, no caso de um menor de idade.
Se ele chegar em qualquer esquina que tem uma boca de fumo o traficante não vai
pedir o RG dele. Seja em qualquer bar, o cara vai pedir o RG dele. E não vai vender para ele porque vai
ser punido. Esse é o ponto.
Reportagem – Como está
o movimento de liberação das drogas?
Petty – A gente
está sendo levado a sério sim. Já é o nosso quarto ano de realização da Marcha
Para todas as marchas a gente teve reuniões com os policiais, inclusive
quinta-feira euu estive lá com eles, mas é mais pensado no trajeto da Marcha.
Condutas que não podem ser feitas durante a Marcha A gente tenta discutir para
evitar problemas Saber até que ponto eles são inegociáveis e até que ponto a
gente é inegociável. É mais para fazer uma parceria para não dar problema. Da
nossa parte, a gente não quer que ninguém saia daqui machucado. O mais é fazer
um diálogo com a população mesmo.
Reportagem – Qual sua
opinião sobre essa edição da marcha que está acontecendo agora?
Petty – Eu acho
que é a mais politizada. Além disso, como movimento de pensar a sociedade,
pensar as proibições. Pensar as políticas de drogas. Na minha quarta marcha eu
não sou o mesmo que era na primeira marcha. Eu faço parte de um grupo de estudos
sobre drogas.
Reportagem – Como é
esse grupo?
Petty – Chama-se
Grupos de Estudos Sobre drogas e é um grupo de estudos da Unicamp, de pessoas
da Unicamp, da população em geral, do Fórum Popular de Saúde da Facamp, da PUC.
Tem advogados, historiadores. Eu sou historiador. Mas tem médicos.
Reportagem – Como a
academia trata o assunto?
Petty – Existe uma
polarização. Com o assunto em voga, as pessoas tendem a se posicionar. E às
vezes se posicionar é ser contra. Na Medicina, por exemplo, a gente tem como
aliado um dos coordenadores desse grupo o Luiz Fernando Tóffoli. Professor
psiquiatra da faculdade de Medicina formado na USP e que é um desproibicionista
dentro da Faculdade de Medicina. Por outro lado, existem outros professores que
observam por outro lado.
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