Resumo crítico da obra: "Como ler Foucault" de Johanna Oksala

O fato de hoje ser assim, não significa que sempre foi ou que será eternamente

De: Walter Poltronieri <wpoltronieri43@gmail.com>

O livro da finlandesa Johanna Oksala é, na minha opinião, a melhor maneira de iniciar a compreensão das ideias do polêmico filósofo francês Michel Foucault (1926-84). O livro é escrito de forma clara e objetiva, com trechos do autor iniciando cada capítulo, além de  trazer exemplos literáricos e metáforas que facilitam as posteriores leituras. Tudo foi contextualizado nas três grandes fases didáticas de Foucault: arqueológica, genealógica e ética, sem que reducionismos ficassem sem as devidas explicações.

Na parte introdutória do livro, a biografia e perfil do filósofo é abordada sem censura. O autor foi polêmico por ter assumido sua homoafetivade, ter tentado suicídio após a internação como louco, por ter usado drogas e gostar das práticas sado-masoquistas. Foucault morreu de AIDS e o companheiro dele é militante para as causas LGBTT na França. Segundo Oksala, esses comportamentos de ousadia fazem simetria com os escritos do autor, uma vez que trouxe conceitos que desafiam a ordem social vigente.

No primeiro capítulo, a autora ressignifica toda a filosofia foucaultiana como uma "caixa de ferramentas", cujo pressuposto é a liberdade para pensar, refletir e agir para mudar a realidade. Em outras palavras, as ferramentas filosóficas e conceituais trazidas por Foucault favorecem o neologismo do pensamento de qualquer tema, o que contribui para a desconstrução das velhas certezas e que nos retira da nossa zona de conforto. Assim, não é por acaso que uma das máximas do filósofo seja: "O fato de hoje ser assim, não significa que sempre foi ou que será eternamente", o que ilustra a sua adesão à corrente pós-estruturalista (não crença de há uma natureza humana atávica).

Em termos metodológicos, qualquer pesquisa ética e séria nas ciências humanas precisará fazer o recorte foucaultiano: buscar como o tema foi tratado em outras épocas e culturas. Ao fazer tal pesquisa, teremos a arqueologia (passado) dos conceitos e também a genealogia (explicação do aqui e agora). Quando se coloca o tema no papel indicando as fases que passou, teremos a cartografia do conceito, bem como uma sinalização de sua trajetória, desvios, quebras e possibilidades de mudança. Hoje, por exemplo, somos "escravos" do biopoder, uma vez que nos preocupamos com a alimentação balanceada, sentimos a pressão para a prática dos exercícios, sem contar das ditaduras da beleza, magreza e juventude!

No livro há a recomendação de que para se alterar alguma parte da sociedade, é necessário, mas não suficiente, saber como ela funciona, bem como seus mecanismos de controle e operacionalização. Foucault oferece sua "caixa de ferramentas", cujo primeiro instrumento seria uma luneta especial para o passado. Por quê especial? Ora, para olhar retrospectivamente o passado, mas com olhos de pesquisador crítico e não simplesmente acumulador de dados e fases historicamente construídas. Em outras palavras, faz-se necessário olhar pela luneta, cujos fragmentos são caleidoscópicos: cada vez que se olhar verá alguma coisa diferente do que já se viu. Esses fragmentos do caleidoscópico serão os elementos básicos para construção e análise do pesquisador foucaultiano. Ele terá a liberdade de escolher o que achar importante para denunciar avanços, retrocessos, pausas, esquecimentos e até momentos em que era proibido tocar ou falar sobre o tema. Ao fazer a cartografia do conceito, segundo Foucault, estará se desvendando a natureza «obrigatória» das ligações entre o que foi escrito (discurso) e também sobre o poder (instituições), evidenciando, dessa forma o quanto há de poder na semiótica daquilo que é dito e escrito pelos homens.

Oksala realmente fez uma leitura bem abrangente das obras, o que pode ser evidenciado quando aborda o tema da microfísica do poder nas instituições: diversos elementos sutis para socializar e fazer com que "todos sejam normais".

Finalmente, 'Como ler Foucault' é de leitura agradável e rápida. Penso que a obra atinge sua meta, ou seja, permitir aos futuros leitores que obtenham uma "bússula" para "navegar" no grande universo foucaultiano, incluindo suas obras, ensaios, aulas, entrevistas. Que pena que eu não tinha uma obra como essa na década de 80!

Prof. Dr. Walter Vieira Poltronieri wpoltronieri43@gmail.com

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